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sábado, 15 de setembro de 2012

“A POLÍCIA É DISCIPLINADA E SEMPRE RESPEITOU SEUS GOVERNANTES, MAS DISCIPLINA NÃO CASA COM FOME. ONDE HÁ FOME NÃO PODE HAVER DISCIPLINA”.


A recente eclosão de manifestações de servidores da segurança pública, no Ceará, na Bahia e no Rio de Janeiro, por melhores salários e condições de trabalho, não ocorreu por acaso. Um fator circunstancial acendeu o rastilho: a resistência governamental em promover a votação da PEC 300, que prevê, entre outras medidas, um piso único nacional. Isso não significa, no entanto, que tenha havido algum planejamento prévio articulado entre as categorias em movimento, embora as chances de que novas revoltas fardadas venham a acontecer em outros estados sejam reais. A insatisfação, afinal, não vem de hoje e só aumenta.

Há outros fatores circunstanciais por detrás dos recentes episódios de luta da categoria da segurança pública. Por exemplo, o relativo sucesso da recente movimentação dos bombeiros do Rio de Janeiro, a partir de meados do ano passado. Certamente pesa também na indignação desses profissionais uma notória contradição entre a propaganda oficial de prosperidade econômica nacional e estadual e a progressiva depreciação salarial da categoria, que, por sinal, sempre cumpriu seu papel a serviço dos interesses do Estado. Mas, por detrás do problema, há questões mais profundas e estruturais que precisam ser analisadas.

Fatores históricos, políticos e econômicos explicam o fato de serem recorrentes no país os movimentos reivindicatórios de salários e melhores condições de trabalho da categoria dos profissionais de segurança pública. Volta e meia há greves, paralisações, operações-padrão ou a ameaça de que ocorram. A Bahia por mais de uma vez sediou algum tipo de manifestação desse gênero na última década, assim como o Ceará e o Rio de Janeiro. Houve também em Alagoas, em 1997. Em Minas Gerais, onde os movimentos eclodem com razoável frequência desde o início dos anos 90, mas, em 1988, no Estado de Minas, o coronel reformado Felisberto de Resende já alertava: “A polícia é disciplinada e sempre respeitou seus governantes, mas disciplina não casa com fome. Onde há fome não pode haver disciplina”. À acusação de quebra da hierarquia e da disciplina, a categoria policial militar, em especial, responde com a sua indignação perante a histórica resistência oficial em cumprir leis e até mesmo decisões judiciais relacionadas a reajustes salariais.

Fato é que a polícia nunca foi bem remunerada no Brasil. E o principal argumento governista sempre foi o da sua incapacidade orçamentária para atender a essa demanda. Há motivos de sobra para se suspeitar da veracidade dessa justificativa. Tal política orçamentária sinaliza a opção dos últimos governos por um determinado modelo de Estado que privilegia o mercado em detrimento da cidadania.

O histórico de salários baixos para a polícia é um dado relevante relacionado ao fenômeno dos movimentos reivindicatórios. Tais salários resultam de uma decisão política, não de contingência financeira. Têm muito mais a ver com as próprias condições militarizadas da origem e o propósito funcional das polícias.No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, o governo fala da inviabilidade de conceder reajustes que resultariam em um impacto de R$ 1 bilhão no orçamento anual de R$ 61.96 bilhões em 2012. Mas esse mesmo governo concordou em conceder mais de R$ 50 bilhões em quatro anos (2007-2010) em isenções fiscais para empresas instaladas no estado. Carece de credibilidade o argumento orçamentário apresentado por um governo afetado gravemente pela corrupção e pela incompetência na gestão dos recursos públicos.

O governo federal e o Congresso perdem, neste momento, a grande oportunidade de um debate mais sério e profundo sobre a necessidade de reforma completa das nossas polícias, a começar pela possibilidade de as polícias conviverem com a democracia interna. Não há como a polícia garantir a democracia nas ruas se, dentro da corporação, não há democracia. A polícia não pode ser a garantidora de um regime democrático se não convive com a democracia. Os códigos de obediência, os códigos de conduta a que responde até hoje, ainda são oriundos da ditadura militar. Enquanto essa realidade persistir, os movimentos reivindicatórios dos servidores da segurança pública carregarão também traços dessa cultura militar. E o debate que precisa ser feito sobre a democratização da polícia não se limita ao debate sobre o direito de greve. Este, por sinal, é um debate muito mais complexo. De qualquer forma, o que essa categoria não pode é perder o apoio da população em sua luta por dignidade.

Como não houve a transição para a democracia na área de segurança pública, isso se traduz na falta de uma cultura sindical, de representatividade, de participação. É indefensável essa concepção de polícia militarizada em pleno século 21, em um Estado democrático de direito.

No final do século 20, o viés conservador do processo de transição política do regime ditatorial para o Estado de Direito culminou com a vitória do autoritarismo no Brasil. Apesar de a Constituição de 1988 ter alterado as premissas gerais da ordem republicana com a normatização de uma série de princípios inovadores, o país manteve viva a mesma cultura militar que, desde os tempos da Corte portuguesa designa as instituições de controle social. Cultura que foi aperfeiçoada durante o período do Estado Novo e consolidada ao longo dos “anos de chumbo”. Apesar de todos os esforços empreendidos durante a década de oitenta, o movimento de democratização do país não conseguiu atingir nem o fetiche pela hierarquia nem a vocação bélica das agências de segurança pública do Brasil.

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