Por Nonato Furtado
Sonhar mais um sonho impossível
Lutar quando é fácil ceder
Vencer o inimigo invencível
Negar quando a regra é vender
Sofrer a tortura implacável
Romper a incabível prisão
Voar num limite improvável
Tocar o inacessível chão
É minha lei, é minha questão
Virar este mundo, cravar este chão
Não me importa saber
Se é terrível demais
Quantas guerras terei que vencer
Por um pouco de paz
E amanhã se esse chão que eu beijei
For meu leito e perdão
Vou saber que valeu
Delirar e morrer de paixão
E assim, seja lá como for
Vai ter fim a infinita aflição
E o mundo vai ver uma flor
Brotar do impossível chão
Lutar quando é fácil ceder
Vencer o inimigo invencível
Negar quando a regra é vender
Sofrer a tortura implacável
Romper a incabível prisão
Voar num limite improvável
Tocar o inacessível chão
É minha lei, é minha questão
Virar este mundo, cravar este chão
Não me importa saber
Se é terrível demais
Quantas guerras terei que vencer
Por um pouco de paz
E amanhã se esse chão que eu beijei
For meu leito e perdão
Vou saber que valeu
Delirar e morrer de paixão
E assim, seja lá como for
Vai ter fim a infinita aflição
E o mundo vai ver uma flor
Brotar do impossível chão
Letra de J.Darion / M.Leigh / Ruy Guerra interpretada por Maria Betânia.
Essa semana, trabalhei essa música em uma palestra para um público de adolescentes em uma escola de Fortaleza. Fiz o contraponto entre uma tira da Mafalda do Quino, cartunista argentino, onde a personagem deixava claro seu pessimismo em relação aos acordos de paz no mundo e o posicionamento da canção em epígrafe. Qual o posição assumida pelos dois autores? Por que eles se posicionam dessa forma? Poderíamos estabelecer algo comum nos dois textos? Qual a nossa posição em relação ao mundo (pós)moderno?
Como alguém que se assume como um estudioso da linguagem e, em particular, das questões discursivas e textuais, considero essa canção um corpus interessante para análise. Mas, não tenho a intenção nem a pretensão de aqui adotar um discurso acadêmico. Esse texto é apenas um diálogo recheado de divagações. Caso seja paciente, conseguirá ler até o final. Caso contrário, já antecipo o pedido de desculpas pela quebra de expectativas.
Então, ao ler esse texto fui conduzido a uma profunda e provocante reflexão. Parto, então ,de uma hipótese: parece que já desistimos de sonhar esses sonhos impossíveis. Parece que é muito cômodo aceitarmos as coisas como estão postas e tentarmos nos convencer que sempre foi assim e sempre será. Para algumas pessoas, soa ridículo ouvir você dizer que acredita que um mundo diferente é possível. Confesso para você que não tenho tanta certeza disso e, às vezes, nenhuma. Ainda bem que são oscilações existenciais. Mas, de que adiantaria a nossa existência se não acreditássemos pelo menos nisso. Para mim, não valeria a pena estudar tanto, me esforçar, traçar debates acirrados com algumas pessoas, ouvir muitas maledicências se o desespero ou a inércia tivessem tomado conta de mim.
Essas inquietações tiram minha concentração, principalmente quando tenho muitos afazeres e prazos a cumprir. Mas, é sempre importante que a correria diária não nos deixe cegos e insensíveis para essas questões. Somos atingidos por bombas de apatia provocadas pelas inconstantes notícias sobre as roubalheiras na política, das injustiças e mazelas sociais, greves, epidemias, e tantos outros tais. Às vezes, me sinto naquele tipo de pesadelo que você sabe que está dormindo, tenta acordar, mas não consegue. Já aconteceu isso com você?
Gosto dessa canção porque ela me sacode da cama, me esmurra, me agride, me provoca, me convida a sair da situação de apatia e a correr na contra mão, nadar contra a corrente, “negar quando a regra é vender”. Precisamos de porções, inda que homeopáticas, de arte como essa, precisamos que a pintura, a literatura, o teatro, a escultura, a música, a dança e o cinema nos arrebatem dessa nossa mediocridade e apontem o dedo na nossa cara e digam: “Somos humanos, ainda!”. Mas, não adianta simplesmente passar por essa catarse em um domingo à tarde no confortável sofá da nossa sala, se sensibilizar e chorar. É necessário um retorno social, uma intervenção através de ações aparentemente insignificantes e imperceptíveis. Pois, somente assim “Vai ter fim a infinita aflição/E o mundo vai ver uma flor/ Brotar no impossível chão.”
Escrito em 27 de abril de 2010.
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